segunda-feira, 16 de julho de 2007

GUIA DAS FALÁCIAS E SOFISMAS

1 INTRODUÇÃO

Ao análisarem-se temas em diversas áreas do conhecimento, freqüentemente nos deparamos com argumentações desprovidas de lógica, apelativas, ofensivas ou equivocadas. A esta forma de argumentação denomina-se como falácias.

Uma falácia ou mentira é um argumento logicamente inconsistente, inválido, ou que falhe de outro modo no suporte eficaz do que pretende provar. Argumentos que se destinam à persuasão podem parecer convincentes para grande parte do público apesar de conterem falácias, mas não deixam de ser falsos por causa disso. Reconhecer as falácias é por vezes difícil.

É importante conhecer os tipos de falácia para evitar armadilhas lógicas na própria argumentação e para analisar a argumentação alheia.

O objetivo de um argumento é expor as razões que sustentam uma conclusão. Um argumento é falacioso quando parece que as razões apresentadas sustentam a conclusão, mas na realidade não sustentam. Da mesma maneira que há padrões típicos, largamente usados, de argumentação correta, também há padrões típicos de argumento falacioso. A tradição lógica e filosófica procurou inventariar e batizar essas falácias típicas e este texto pretende abordá-las.

O texto aqui abordado se trata do GUIA DE FALÁCIAS LÓGICAS DE STEPHEN DOWNES é será extremamente útil em utilizá-lo em abordagem de diversos temas, sejam pertencentes à área das ciências naturais, ciências humanas, filosófia e teologia.


2 CONCEITOS LÓGICOS

Antes de abordarmos as falácias propriamente ditas, é conveniente que se faça uma apresentação a respeito de conceitos lógicos utilizados na formação do raciocínio argumentativo.
O conhecimento da lógica é de extrema necessidade no que tange ao trato de uma argumenação teórica a fim de se delinear uma tese sobre a veracidade ou não de um tema sob estudo.

2.1 LÓGICA

Define-se lógica como “a ciência da argumentação, prova, reflexão ou inferência”. Ela lhe permitirá analisar um argumento ou raciocínio e deliberar sobre sua veracidade. A lógica não é um pressuposto para a argumentação, é claro; mas conhecendo-a, mesmo que superficialmente, torna-se mais fácil evidenciar argumentos inválidos.
Há muitos tipos de lógica, como a difusa e a construtiva; elas possuem diferentes regras, vantagens e desvantagens. Este documento discute apenas a Booleana simples, pois é largamente conhecida e de compreensão relativamente fácil. Quando indivíduos falam sobre algo ser “lógico”, geralmente se referem à lógica que será tratada aqui.

A lógica não é uma lei absoluta que governa o universo. Muitas pessoas, no passado, concluíram que se algo era logicamente impossível (dada a ciência da época), então seria literalmente impossível. Acreditava-se também que a geometria euclidiana era uma lei universal; afinal, era logicamente consistente. Mas sabemos que tais regras geométricas não são universais.
A lógica também não é um conjunto de regras que governa o comportamento humano. Pessoas podem possuir objetivos logicamente conflitantes.


2.2 ARGUMENTOS

Um argumento é uma série concatenada de afirmações com o fim de estabelecer uma proposição definida.
Existem vários tipos de argumento; iremos discutir os chamados dedutivos. Esses são geralmente vistos como os mais precisos e persuasivos, provando categoricamente suas conclusões; podem ser válidos ou inválidos.
Argumentos dedutivos possuem três estágios:
premissas, inferência e conclusão. Entretanto, antes de discutir tais estágios detalhadamente, precisamos examinar os alicerces de um argumento dedutivo: operadores proposicionais e proposições.

2.2.1 Operadores proposicionais

Os operadores proposicionais aplicam-se a uma ou duas proposições para formar novas proposições.

Quando o valor de verdade da nova proposição é determinado unicamente

  1. Pelos valores de verdade das proposições ligadas, e
  2. Pelo operador aplicado,

diz-se que o operador é verofuncional.

Há cinco operadores proposicionais verofuncionais: negação, conjunção, disjunção, condicional e bicondicional.

2.2.1.1 Negação

Qualquer proposição P pode ser negada mediante o operador negação, gerando uma nova proposição complexa: Não-P

A proposição Não P será verdadeira apenas se P for falsa. Será falsa apenas se P for verdadeira. A tabela de verdade de Não P é a seguinte:

P

Não-P

V

F

F

V

2.2.2.2 Conjunção

Quaisquer duas proposições, P e Q, podem ser conectadas gerando uma proposição nova e complexa: "P e Q". A proposição "P e Q" será verdadeira se e apenas se "P" e "Q" forem verdadeiras. Com qualquer outra combinação de valores de verdade será falsa.

A tabela de verdade de P e Q é a seguinte:

P

Q

P e Q

V

V

V

V

F

F

F

V

F

F

F

F

2.2.2.3 Disjunção

Quaisquer duas proposições, P e Q, podem conectar-se como alternativas mútuas, produzindo uma nova proposição (complexa), P ou Q.

A proposição "P ou Q" será verdadeira se pelo menos uma das alternativas, P ou Q, for verdadeira. Será falsa se nenhuma for verdadeira.

A tabela de verdade de P ou Q é a seguinte:

P

Q

P ou Q

V

V

V

V

F

V

F

V

V

F

F

F

2.2.2.4 Condicional

Quaisquer duas proposições, P e Q, podem ser conectadas pelo condicional gerando a nova proposição complexa, Se P, então Q

A proposição Se P, então Q é verdadeira se e só se P for falsa ou Q for verdadeira. Só é falsa quando P é verdadeira e Q falsa.

A tabela de verdade de Se P, então Q é a seguinte:

P

Q

Se P, então Q

V

V

V

V

F

F

F

V

V

F

F

V

2.2.2.5 Bicondicional

Quaisquer duas proposições P e Q podem ser ligadas com o bicondicional, gerando uma nova proposição complexa: P se e só se Q.

A proposição P se e só se Q é verdadeira se e apenas se P e Q tiverem o mesmo valor de verdade — se ambas P e Q forem verdadeiras ou ambas falsas.

A tabela de verdade de P se e só se Q é a seguinte:

P

Q

P se Q

V

V

V

V

F

F

F

V

F

F

F

V

2.2.2 Proposição

Uma proposição é uma afirmação que pode ser verdadeira ou falsa. Ela é o significado da afirmação, não um arranjo preciso das palavras para transmitir esse significado.

Por exemplo, “Existe um número primo par maior que dois” é uma proposição (no caso, uma falsa). “Um número primo par maior que dois existe” é a mesma proposição expressa de modo diferente.

Infelizmente, é muito fácil mudar acidentalmente o significado das palavras apenas reorganizando-as. A dicção da proposição deve ser considerada como algo significante.

É possível utilizar a lingüística formal para analisar e reformular uma afirmação sem alterar o significado; entretanto, este documento não pretende tratar de tal assunto.


Usamos frases para exprimir proposições. Mas nem toda a frase é proposição: ordens, perguntas, conselhos só em casos especiais contêm proposições.

Exemplos:

  1. As seguintes frases exprimem a mesma proposição:
    • Está a chover.
    • Esta llooviendo.
    • It is raining.
    • Il pleut.
  2. As seguintes frases exprimem a mesma proposição:
    • João ama Maria.
    • Maria é amada pelo João.

Discussão: Faz sentido pensar numa proposição como o significado de uma frase. O significado de uma frase tem várias componentes:

  • denotação: o estado de coisas que a frase afirma ser o caso.
  • conotação: os sentimentos, ideias ou emoções provocadas pela frase no auditor.
  • ênfase: a importância relativa que o autor atribui aos diferentes elementos da frase.
    Por exemplo, na frase "O fogo enfurecia-se pelo monte" a denotação da frase é asserção de que um fogo ocorre no monte. A conotação é a de que isso deve ser temido (a palavra "enfurecia-se" implica cólera e perigo). O ênfase desta frase está no próprio fogo. Se tivéssemos escrito "Pelo monte enfurecia-se o fogo" o ênfase estaria no monte.

Os filósofos discutem bastante sobre o significado. Alguns dizem que o significado é apenas a denotação. Outros dizem que é a combinação apenas da denotação e da conotação. Outros ainda (incluindo Stephen Downes) dizem que o significado é a combinação dos três — denotação, conotação e ênfase.

2.2.2.1 Valor de Verdade

Uma proposição pode ter um dos seguintes valores de verdade:

  • verdade
  • falsidade

Os filósofos discutem muito sobre o que constitui a verdade. Por agora podemos usar uma caracterização muito simples:

  • "P" é verdadeira se e somente se P.
  • "P" é falsa se e apenas se não-P.

Exemplos:

  • A proposição "A neve é branca" é verdadeira se e somente se a neve for branca.
  • A proposição "A neve é branca" é falsa se e somente se a neve não for branca.

Por outras palavras, uma proposição é verdadeira se ela descreve correctamente um estado do mundo, e será falsa se descrever incorrectamente um estado do mundo. Isto é conhecido como A Teoria da Verdade de Tarski.

2.2.3 Premissas

Argumentos dedutivos sempre requerem um certo número de “assunções-base”. São as chamadas premissas; é a partir delas que os argumentos são construídos; ou, dizendo de outro modo, são as razões para se aceitar o argumento. Entretanto, algo que é uma premissa no contexto de um argumento em particular, pode ser a conclusão de outro, por exemplo.

As premissas do argumento sempre devem ser explicitadas, esse é o princípio do audiatur et altera pars*. A omissão das premissas é comumente encarada como algo suspeito, e provavelmente reduzirá as chances de aceitação do argumento.

A apresentação das premissas de um argumento geralmente é precedida pelas palavras “Admitindo que...”, “Já que...”, “Obviamente se...” e “Porque...”. É imprescindível que seu oponente concorde com suas premissas antes de proceder com a argumentação.

Usar a palavra “obviamente” pode gerar desconfiança. Ela ocasionalmente faz algumas pessoas aceitarem afirmações falsas em vez de admitir que não entendem por que algo é “óbvio”. Não hesite em questionar afirmações supostamente “óbvias”.

* Expressão latina que significa “a parte contrária deve ser ouvida”.

2.2.4 Inferência

Umas vez que haja concordância sobre as premissas, o argumento procede passo a passo através do processo chamado inferência.

Na inferência, parte-se de uma ou mais proposições aceitas (premissas) para chegar a outras novas. Se a inferência for válida, a nova proposição também deve ser aceita. Posteriormente essa proposição poderá ser empregada em novas inferências.

Assim, inicialmente, apenas podemos inferir algo a partir das premissas do argumento; ao longo da argumentação, entretanto, o número de afirmações que podem ser utilizadas aumenta.

Há vários tipos de inferência válidos, mas também alguns inválidos, os quais serão analisados neste documento. O processo de inferência é comumente identificado pelas frases “conseqüentemente...” ou “isso implica que...”.

2.2.5 Conclusão

Finalmente se chegará a uma proposição que consiste na conclusão, ou seja, no que se está tentando provar. Ela é o resultado final do processo de inferência, e só pode ser classificada como conclusão no contexto de um argumento em particular.

A conclusão se respalda nas premissas e é inferida a partir delas. Esse é um processo sutil que merece explicação mais aprofundada.


2.2.6 A implicação em detalhes

Evidentemente, pode-se construir um argumento válido a partir de premissas verdadeiras, chegando a uma conclusão também verdadeira. Mas também é possível construir argumentos válidos a partir de premissas falsas, chegando a conclusões falsas.

O “pega” é que podemos partir de premissas falsas, proceder através de uma inferência válida, e chegar a uma conclusão verdadeira. Por exemplo:

– Premissa: Todos peixes vivem no oceano.

– Premissa: Lontras são peixes.

– Conclusão: Logo, lontras vivem no oceano.

Há, no entanto, uma coisa que não pode ser feita: partir de premissas verdadeiras, inferir de modo correto, e chegar a uma conclusão falsa.

Podemos resumir esses resultados numa tabela de “regras de implicação”. O símbolo “implica” denota implicação; “A” é a premissa, “B” é a conclusão.

Regras de implicação

Premissa Conclusão Inferência
A B A implica B
Falsa Falsa Verdadeira
Falsa Verdadeira Verdadeira
Verdadeira Falsa Falsa
Verdadeira Verdadeira Verdadeira


– Se as premissas são falsas e a inferência válida, a conclusão pode ser verdadeira ou falsa (linhas 1 e 2).

– Se a premissa é verdadeira e a conclusão falsa, a inferência é inválida (linha 3).

– Se as premissas e inferência são válidas, a conclusão é verdadeira (linha 4).

Desse modo, o fato de um argumento ser válido não significa necessariamente que sua conclusão é verdadeira, pois pode ter partido de premissas falsas.

Um argumento válido que foi derivado de premissas verdadeiras é chamado “argumento consistente”. Esses obrigatoriamente chegam a conclusões verdadeiras.

2.2.7 Exemplo de argumento

A seguir está exemplificado um argumento válido, mas que pode ou não ser “consistente”.

1 – Premissa: Todo evento tem uma causa.

2 – Premissa: O Universo teve um começo.

3 – Premissa: Começar envolve um evento.

4 – Inferência: Isso implica que o começo do Universo envolveu um evento.

5 – Inferência: Logo, o começo do Universo teve uma causa.

6 – Conclusão: O Universo teve uma causa.

A proposição da linha 4 foi inferida das linhas 2 e 3. A linha 1, então, é usada em conjunto com proposição 4, para inferir uma nova proposição (linha 5). O resultado dessa inferência é reafirmado (numa forma levemente simplificada) como sendo a conclusão.

2.2.8 Reconhecendo argumentos

O reconhecimento de argumentos é mais difícil que das premissas ou conclusão. Muitas pessoas abarrotam textos de asserções sem sequer produzir algo que possa ser chamado argumento.

Algumas vezes os argumentos não seguem os padrões descritos acima. Por exemplo, alguém pode dizer quais são suas conclusões e depois justificá-las. Isso é válido, mas pode ser um pouco confuso.

Para piorar a situação, algumas afirmações parecem argumentos, mas não são. Por exemplo: “Se a Bíblia é verdadeira, Jesus ou foi um louco, um mentiroso, ou o Filho de Deus”.

Isso não é um argumento; é uma afirmação condicional. Não explicita as premissas necessárias para embasar as conclusões, sem mencionar que possui outras falhas *(Nota 1).

Um argumento não equivale a uma explicação. Suponha que, tentando provar que Albert Einstein acreditava em Deus, disséssemos: “Einstein afirmou que ‘Deus não joga dados’ porque cria em Deus”.

Isso pode parecer um argumento relevante, mas não é; trata-se de uma explicação da afirmação de Einstein. Para perceber isso, lembre-se que uma afirmação da forma “X porque Y” pode ser reescrita na forma “Y logo X”. O que resultaria em: “Einstein cria em Deus, por isso afirmou que ‘Deus não joga dados’”.

Agora fica claro que a afirmação, que parecia um argumento, está admitindo a conclusão que deveria estar provando.

Ademais, Einstein não cria num Deus pessoal preocupado com assuntos humanos.

2.2.9 Conclusão sobre o tópico

Esboçou-se a estrutura de um argumento “consistente” dedutivo desde premissas até a conclusão; contudo, em última análise, a conclusão só pode ser tão persuasiva quanto as premissas utilizadas. A lógica em si não resolve o problema da verificação das premissas; para isso outra ferramenta é necessária.

O método de investigação preponderante é o científico. No entanto, a filosofia da ciência e o método científico são assuntos extremamente extensos e explicá-los está muito além das pretensões deste texto.


3 FALÁCIAS E SUAS CLASSIFICAÇÕES

Há um certo número de “armadilhas” a serem evitadas quando se está construindo um argumento dedutivo; elas são conhecidas como falácias. Na linguagem do dia-a-dia, nós denominamos muitas crenças equivocadas como falácias, mas, na lógica, o termo possui significado mais específico: falácia é uma falha técnica que torna o argumento inconsistente ou inválido.

(Além da consistência do argumento, também se podem criticar as intenções por detrás da argumentação.)

Argumentos contentores de falácias são denominados falaciosos. Freqüentemente parecem válidos e convincentes; às vezes, apenas uma análise pormenorizada é capaz de revelar a falha lógica.

A seguir está uma lista das falácias mais comuns e determinadas técnicas retóricas bastante utilizadas em debates. A intenção não foi criar uma lista exaustivamente grande, mas apenas ajuda-lo a reconhecer algumas das falácias mais comuns, evitando, assim, ser enganado por elas.


3. 1 Falácias da dispersão

Cada uma destas falácias caracteriza-se pelo uso ilegítimo de um operador proposicional, uso que desvia a atenção do auditório da falsidade de uma certa proposição.

Uma proposição é a afirmação de que algo é verdadeiro. De outro modo: uma proposição é uma afirmação que ou é verdadeira ou é falsa.

Usamos frases para exprimir proposições. Mas nem toda a frase é proposição: ordens, perguntas, conselhos só em casos especiais contêm proposições.

3.1.1 Falso dilema

É dado um limitado número de opções (na maioria dos casos apenas duas), quando de facto há mais. O falso dilema é um uso ilegítimo do operador "ou". Pôr as questões ou opiniões em termos de "ou sim ou sopas" gera, com frequência (mas nem sempre), esta falácia.

Exemplos:

  • Ou concordas comigo ou não. (Porque se pode concordar parcialmente.)
  • Reduz-te ao silêncio ou aceita o país que temos. (Porque uma pessoa tem o direito de denunciar o que entender.)
  • Ou votas no Silveira ou será a desgraça nacional. (Porque os outros candidatos podem não ser assim tão maus.)
  • Uma pessoa ou é boa ou é má. (Porque muitas pessoas são apenas parcialmente boas.)

Prova: Identifique as opções dadas e mostre (de preferência com um exemplo) que há pelo menos uma opção adicional.

3.1.2 Apelo à Ignorância (argumentum ad ignorantiam)

Os argumentos desta classe concluem que algo é verdadeiro por não se ter provado que é falso; ou conclui que algo é falso porque não se provou que é verdadeiro. (Isto é um caso especial do falso dilema, já que presume que todas as proposições têm de ser realmente conhecidas como verdadeiras ou falsas). Mas, como Davis escreve, "A falta de prova não é uma prova."

Exemplos:

  • Os fantasmas existem! Já provaste que não existem?
  • Como os cientistas não podem provar que se vai dar uma guerra global, ela provavelmente não ocorrerá.
  • Fred disse que era mais esperto do que Jill, mas não o provou. Portanto, isso deve ser falso.

Prova: Identifique a proposição em questão. Argumente que ela pode ser verdadeira (ou falsa) mesmo que, por agora, não o saibamos.

3.1.3 Derrapagem (bola de neve)

Para mostrar que uma proposição, P, é inaceitável, se extraem conseqüências inaceitáveis de P e conseqüências das conseqüências... O argumento é falacioso quando pelo menos um dos seus passos é falso ou duvidoso. Mas a falsidade de uma ou mais premissas é ocultada pelos vários passos "se... então..." que constituem o todo do argumento.

Exemplos:

  • Se aprovarmos leis contra as armas automáticas, não demorará muito até aprovarmos leis contra todas as armas, e então começaremos a restringir todos os nossos direitos. Acabaremos por viver num estado totalitário. Portanto não devemos banir as armas automáticas.
  • Nunca deves jogar. Uma vez que comeces a jogar verás que é difícil deixar o jogo. Em breve estarás a deixar todo o teu dinheiro no jogo e, inclusivamente, pode acontecer que te vires para o crime para suportar as tuas despesas e pagar as dívidas.
  • Se eu abrir uma exceção para ti, terei de abrir exceções para todos.

Prova: Identifique a proposição, P, que está a ser refutada e identifique o evento final, Q, da série de eventos. Depois mostre que este evento final, Q, não tem de ocorrer como conseqüência de P.

3.1.4 Pergunta Complexa

Dois tópicos sem relação, ou de relação duvidosa, são conjugados e tratados como uma única proposição. Pretende-se que o auditório aceite ou rejeite ambas quando, de fato, uma pode ser aceitável e a outra não. Trata-se de um uso abusivo do operador "e".

Exemplos:

  • Deves apoiar a educação familiar e o Direito, dado por Deus, de os pais educarem os filhos de acordo com as suas crenças.
  • Apóias a liberdade e o direito de andar armado?
  • Já deixaste de fazer vendas ilegais? (São duas questões: já cometeste ilegalidades? Já te deixaste disso?)

Prova: Identifique as duas proposições conectadas e mostre que acreditar numa não implica acreditar na outra.


3.2 Apelo a motivos (em vez de razões)

As falácias desta secção têm em comum o fato de apelarem a emoções ou a outros fatores psicológicos. Não avançam razões para apoiar a conclusão.

3.2.1 Apelo à força (argumentum ad baculum)

O auditório é informado das conseqüências desagradáveis que se seguirão à discordância com o autor. Exemplos:

  • É melhor admitires que a nova orientação da empresa é a melhor — se pretendes manter o emprego.
  • A NAFTA é um erro! E se não votares contra a NAFTA, então "votamos-te" para fora do escritório.

Prova: Identifique a ameaça e a proposição. Argumente que a ameaça não tem relação com a verdade ou a falsidade da proposição.

3.2.2 Apelo à Piedade (argumentum ad misercordiam)

Definição: Pede-se a aprovação do auditório na base do estado lastimoso do Autor.

Exemplos:

  • Como pode dizer que eu reprovo? Eu estava mais perto da positiva e, além disso, estudei 16 horas por dia.
  • Esperamos que aceite as nossas recomendações. Passamos os últimos três meses a trabalhar desalmadamente nesse relatório.

Prova: Identifique a proposição e o apelo à autoridade e argumente que o estado lastimoso do argumentador nada tem a ver com a verdade da proposição.

3.2.3 Apelo às consequências (argumentum ad consequentiam)

O argumentador, para “mostrar” que uma crença é falsa, aponta conseqüências desagradáveis que advirão da sua defesa.

Exemplos:

  • Não podes aceitar que a teoria da evolução é verdadeira, porque se fosse verdadeira estaríamos ao nível dos macacos.
  • Deve-se acreditar em Deus, porque de outro modo a vida não teria sentido. (Talvez. Mas também é possível dizer que, como a vida não tem sentido, Deus não existe.)

Prova: Identifique as consequências e argumente que a realidade não tem de se adaptar aos nossos desejos.

3.2.4 Apelo a Preconceitos

Termos carregados e emotivos são usados para ligar valores morais à crença na verdade da proposição.

Exemplos:

  • Os portugueses bem intencionados estão de acordo em votar a pena de morte.
  • As pessoas razoáveis concordarão com a nossa política fiscal.
  • O primeiro-ministro tem a veleidade de pensar que as novas taxas de juro ajudarão a diminuir o déficit. (O uso de "tem a veleidade de pensar" sugere sem argumentos que o primeiro ministro está enganado.)
  • Os burocratas do parlamento resistem às leis de defesa do patrimônio. (Compare-se com: "Os parlamentares rejeitaram a proposta de lei de defesa do patrimônio.")

Prova: Identifique os termos preconceituosos usados: (p. ex.:. "portugueses bem intencionados" ou "Pessoas razoáveis"). Mostre que discordar da conclusão não é suficiente para dizer que a pessoa é "mal intencionada" ou "pouco razoável".

3.2.5 Apelo ao povo (argumentum ad populum)

Com esta falácia sustenta-se que uma proposição é verdadeira por ser aceite como verdadeira por algum sector representativo da população. Esta falácia é, por vezes, chamada "Apelo à emoção" porque os apelos emocionais pretendem atingir, muitas vezes, a população como um todo.

Exemplos:

  • Se você fosse bela poderia viver como nós. Compre também Buty-EZ e torne-se bela. (Aqui apela-se às "pessoas bonitas")
  • As sondagens sugerem que os liberais vão ter a maioria no parlamento, também deves votar neles.
  • Toda a gente sabe que a Terra é plana. Então por que razão insistes nas tuas excêntricas teorias?

3.3 Fugir ao assunto

As falácias desta secção fogem ao assunto, discutindo a pessoa que avançou um argumento em vez de discutir razões para aceitar ou não aceitar a conclusão. Em algumas ocasiões é aceitável citar autoridades, (por exemplo, citar o médico para justificar o uso de um medicamento) quase nunca é apropriado discutir a pessoa em vez dos seus argumentos.

3.3.1 Ataques pessoais (argumentum ad hominem)

Ataca-se pessoa que apresentou um argumento e não o argumento que apresentou. A falácia ad hominem assume muitas formas. Ataca, por exemplo, o caráter, a nacionalidade, a raça ou a religião da pessoa. Em outros casos, a falácia sugere que a pessoa, por ter algo tem algo a ganhar com o argumento, é movida pelo interesse. A pessoa pode ainda ser atacada por associação ou pelas suas companhias.

Há três formas maiores da falácia ad hominem:
3.3.1.1
Ad hominem
(abusivo): em vez de atacar uma afirmação, o argumento ataca pessoa que a proferiu.
3.3.1.2 Ad hominem
(circunstancial): em vez de atacar uma afirmação, o autor aponta para as circunstâncias em que a pessoa que a fez e as suas circunstâncias.
3.3.1.3 Tu quoque: esta forma de ataque à pessoa consiste em fazer notar que a pessoa não pratica o que diz.

Exemplos:

  1. Podes dizer que Deus não existe mas estás apenas a seguir a moda (ad hominem abusivo).
  2. É natural que o ministro diga que essa política fiscal é boa porque ele não será atingido por ela (ad hominem circunstancial).
  3. Podemos passar por alto as afirmações de Simplício porque ele é patrocinado pela indústria da madeira (ad hominem circunstancial).
  4. Dizes que eu não devo beber, mas não estás sóbrio faz mais de um ano (tu quoque).

Prova: Identifique o ataque e mostre que o carácter ou as circunstâncias da pessoa nada tem a ver com a verdade ou falsidade da proposição defendida.

3.3.2 Apelo à autoridade (argumentum ad verecundiam)

Ainda que às vezes seja apropriado citar uma autoridade para suportar uma opinião, a maioria das vezes não o é. O apelo à autoridade é especialmente impróprio se:

  1. A pessoa não está qualificada para ter uma opinião de perito no assunto.
  2. Não há acordo entre os peritos do campo em questão.
  3. A autoridade não pode, por algum motivo, ser levada a sério — porque estava brincar, estava ébria ou por qualquer outro motivo.

Uma variante da falácia do apelo à autoridade é o "ouvi dizer" ou "diz-se que". Um argumento por "ouvir dizer" é um argumento que depende de fontes em segunda ou terceira mão.

Exemplos:

  1. O famoso psicólogo Dr. Frasier Crane recomenda-lhe que compre o último modelo de carro da Skoda.
  2. O economista John Kenneth Galbraith defende que uma apertada política econômica é a melhor cura para a recessão. (Apesar de Galbraith ser um perito, nem todos os economistas estão de acordo nesta questão.)
  3. Encaminhamo-nos para uma guerra nuclear. A semana passada Ronald Reagan disse que começaríamos a bombardear a Rússia em menos de cinco minutos. (Claro que o disse por piada ao testar o microfone.)
  4. Sousa disse que nunca perdoaria ao Pinto. (Trata-se de um caso de “ouvir dizer” — de fato ele apenas disse que Pinto nada tinha feito para ser perdoado.)

Prova: Mostre uma de duas coisas (ou ambas):

  1. A pessoa citada não é uma autoridade no campo em questão;
  2. Entre os especialistas não há consenso sobre o assunto discutido.

3.3.3 Autoridade anônima

A autoridade em questão não é nomeada. Isto é uma forma de apelo à autoridade porque quando a autoridade não é nomeada é impossível confirmar caso se trate de um perito. Esta falácia é tão comum que merece uma menção especial. Uma variante desta falácia é o apelo ao rumor. Como a fonte do rumor é, em regra, desconhecida, não é possível verificar se o rumor merece crédito. Rumores falsos e caluniosos são lançados muitas vezes intencionalmente com o objetivo de desacreditar o oponente.

Exemplos:

  1. Um membro do governo disse que uma nova lei sobre posse e uso de armas será proposta amanhã.
  2. Os peritos dizem que a melhor maneira de prevenir uma guerra nuclear é estar preparado para ela.
  3. Sabe-se que milhares de operações desnecessárias são realizadas todos os anos.
  4. Diz-se que o primeiro-ministro vai decretar outro feriado antes das eleições.

Prova: Argumente que pelo fato de não conhecermos a fonte e a base da informação, não temos maneira de avaliar a confiabilidade da informação.

3.3.4 Estilo sem substância

Pretende-se que o modo como o argumento ou o argumentador se apresentam contribui para a verdade da conclusão.

Exemplos:

  1. Nixon perdeu o debate presidencial porque tinha suor na testa.
  2. Trudeau sabe dirigir as massas. Ele deve ter razão.
  3. Por que não aceitas o conselho daquele jovem elegante e bem parecido?

Prova: É um fato que o modo como o argumento é apresentado, influencia a crença das pessoas na verdade da conclusão. Mas a verdade da conclusão não depende do modo como o argumento é apresentado. Para mostrar que esta falácia está a ser cometida, mostre que, neste caso, o estilo não afete a verdade ou a falsidade da conclusão.


3.4 Falácias indutivas

O raciocínio indutivo consiste em inferir das propriedades de uma amostra para as propriedades de um elemento não pertencente à amostra ou para as propriedades da população como um todo. Suponha-se, por exemplo, que temos uma lata com 1000 feijões. Alguns são pretos e outros são brancos. Suponha agora que retiramos da lata uma amostra de 100 feijões e que 50 eram brancos e outros 50 eram pretos. Então, podemos inferir indutivamente que metade dos feijões da lata (500 feijões) são pretos e que a outra metade é branca.

Todo o raciocínio indutivo depende da semelhança entre a amostra e a população. Quanto maior for a semelhança entre a amostra e a população como um todo, maior confiabilidade terá a inferência indutiva. Por outro lado, se a amostra tiver diferenças relevantes face à população, então a inferência indutiva não será fiável.

Mesmo que as premissas de um raciocínio indutivo sejam verdadeiras, a conclusão pode ser falsa. Apesar disso, uma boa inferência indutiva dá-nos uma boa razão para pensar que a conclusão é verdadeira.

3.4.1 Generalização Precipitada

A amostra é demasiado limitada e é usada apenas para apoiar uma conclusão tendenciosa.

Exemplos:

  1. Fred, o australiano, roubou a minha carteira. Portanto, os Australianos são ladrões. (Claro que não devemos julgar os Australianos na base de um exemplo.)
  2. Perguntei a seis dos meus amigos o que eles pensavam das novas restrições ao consumo e eles concordaram em que se trata de uma boa idéia. Portanto as novas restrições são populares.

Prova: Identifique as dimensões da amostra e a população em questão. Depois mostre que a amostra é insuficiente. Note-se que uma prova formal requer cálculo matemático porque está em jogo a teoria das probabilidades. Mas em muitas situações podemos confiar no bom senso.

3.4.2 Amostra limitada

Há diferenças relevantes entre a amostra usada na inferência indutiva e a população como um todo

Exemplos:

  1. Para ver como os Portugueses vão votar na próxima eleição sondou-se uma centena de pessoas em Bragança. Isto mostra, sem dúvida, que a direita vai limpar as eleições. (As pessoas de Bragança tendem a ser mais conservadoras e, portanto, mais propensas a votar em partidos de direita do que as outras pessoas no resto do país.)
  2. As maçãs do topo da caixa parecem boas. Todas as maçãs desta caixa devem ser boas.(As maçãs com bicho, claro, estão em camadas mais fundas...)

Prova: Mostre que há diferenças relevantes entre a amostra e a população como um todo. Depois, argumente que por a amostra ser diferente, a conclusão é provavelmente diferente.

3.4.3 Falsa analogia

Numa analogia mostra-se, primeiro, que dois objetos, a e b, são semelhantes em algumas das suas propriedades, F, G, H. Conclui-se, depois, que como a tem a propriedade E, então b também deve ter a propriedade E. A analogia falha quando os dois objetos, a e b, diferem de tal modo que isso possa afetar o fato de ambos terem a propriedade E. Diz-se, neste caso, que a analogia não teve em conta diferenças relevantes.

Exemplos:

  1. Os empregados são como pregos. Temos de martelar a cabeça dos pregos para estes desempenharem a sua função. O mesmo deve acontece com os empregados.
  2. Governar um país é como gerir uma empresa. Assim, como a gestão de uma empresa responde unicamente ao lucro dos seus acionistas, também governar uma nação deve fazer o mesmo. (Mas os objetivos de governar e gerir uma empresa são muito diferentes; assim, provavelmente têm de encontrar critérios diferentes.)

Prova: Identifique os dois objetos ou eventos que estão a ser comparados e a propriedade que se diz que ambos possuem. Mostre que os dois objetos diferem de tal modo que a analogia se torna insuficiente.

3.4.4 Indução preguiçosa

A conclusão apropriada de um argumento indutivo é negada apesar dos dados.

Exemplos:

  1. Hugo teve doze acidentes nos últimos 6 meses. No entanto, ele continua a dizer que se trata de coincidência e não de culpa sua. (Indutivamente, as provas apontam irresistivelmente para a culpa de Hugo.)
  2. Sondagens e mais sondagens mostram que o N.D.P. ganhará menos de 10 lugares no Parlamento. Apesar disso o líder do Partido insiste em que o Partido terá muito mais votos do que as sondagens sugerem. ( De fato o N.D.P. só obteve 9 lugares.)

Prova: Acima de tudo pode insistir na força da inferência.

3.4.5 Omissão de dados

Dados importantes, que arruinariam um argumento indutivo, são excluídos. A exigência de que toda a informação relevante e disponível seja incluída num argumento indutivo, é chamada "princípio da informação total".

Exemplos:

  1. O João é alentejano, e a maioria dos alentejanos vota no PCP, portanto o João provavelmente votará no PCP. (A informação deixada de fora é que o João vive em Évora e a maioria dos eborenses vota PS.)
  2. Muito provavelmente o Benfica vai ganhar este jogo porque ganhou nove dos últimos dez jogos. (Oito das vitórias foram obtidas sobre equipas de escalões secundários, na fase de preparação, e o Benfica vai agora defrontar uma equipa de primeiro plano.)

Prova: Exponha os dados em falta e mostre que eles mudam a conclusão do argumento indutivo. Note-se que não basta mostrar que nem todas as provas foram incluídas — é preciso mostrar que as provas em falta justificam outra conclusão.


3.5 Falácias com regras gerais

Uma regra geral é um enunciado habitualmente verdadeiro, mas nem sempre o é. As regras gerais são indicadas, muitas vezes, por expressões como "quase sempre" ou "a maioria". Por exemplo, "a maioria dos conservadores favorecem cortes na Segurança Social". Algumas vezes usamos a palavra "geralmente", como em "Geralmente os conservadores são a favor de cortes na Segurança Social". Mas algumas vezes nenhuma palavra específica é usada, como, por exemplo, em "Os conservadores favorecem cortes na Segurança Social". As regras gerais nem sempre são estritamente verdadeiras. Portanto, quando alguém trata uma regra geral como se fosse estritamente sempre verdadeira, comete uma falácia.

3.5.1 Falácia do acidente

É aplicada a regra geral quando as circunstâncias sugerem que se deve aplicar uma exceção à regra.

Exemplos:

  1. A lei diz que não deves conduzir a mais de 50 Km/h. Portanto, mesmo que o teu pai não possa respirar, não deves passar dos 50 km/h.
  2. É bom devolver as coisas que nos emprestaram. Portanto, deves devolver essa arma automática ao louco que te a emprestou. (Adaptado de Platão, A República, I).

Prova: Identifique a regra geral em questão e mostre que não é uma regra geral estrita. Depois mostre que as circunstâncias deste caso sugerem que a regra não deve aplicar-se.

3.5.2 Falácia inversa do acidente

Aplica-se uma exceção à regra geral a casos em que se deve aplicar a regra geral.

Exemplos:

  1. Se deixarmos os doentes terminais usar heroína, devemos deixar toda a gente usá-la.
  2. Se deixou que Joana, a tal moça que foi atropelada por um caminhão, entregasse o trabalho mais tarde, também deveria permitir que toda a turma entregasse o trabalho mais tarde.

Prova: Identifique a regra geral em questão e mostre que o caso especial é uma exceção à regra.


3.6 Falácias causais

Os argumentos causais são os argumentos onde se conclui que uma coisa ou acontecimento causa outra. São muito comuns mas, como a relação entre causa e efeito é complexa, é fácil cometer erros. Em regra, diz-se que C é a causa do efeito E se e só se:

  1. Geralmente, quando C ocorre, também E ocorre; e
  2. Geralmente, se C não ocorre, então E também não ocorre.

Diz-se "geralmente" porque há sempre exceções. Diz-se, por exemplo, que riscar o fósforo é a causa da chama porque:

  1. Geralmente, quando riscamos o fósforo ele acende (exceto quando riscamos o fósforo dentro de água...); e
  2. Geralmente, quando o fósforo não é riscado, ele não acende (exceto quando o acendemos com um maçarico...).

Muitos especialistas requerem também que uma afirmação causal seja apoiada por uma lei da natureza. Por exemplo, a afirmação "riscar o fósforo é a causa da chama" é justificado pelo princípio "a fricção produz calor, e o calor produz o fogo".

3.6.1 Depois disso, por causa disso (post hoc ergo propter hoc)

O nome em Latim significa: "depois disso, logo, por causa disso". Isto descreve a falácia. Um autor comete a falácia quando pressupõe que, por uma coisa se seguir a outra, então aquela teve de ser causada por esta.

Exemplos:

  1. A imigração do Alentejo para Lisboa aumentou mal a prosperidade aumentou. Portanto, o incremento da imigração foi causado pelo incremento da properidade.
  2. Tomei o EZ-Mata-Gripe e dois dias depois a minha constipação desapareceu...

Prova: Mostre que a correlação é coincidência, mostrando: 1) que o "efeito" teria ocorrido mesmo sem a alegada causa ocorrer, ou que 2) o efeito teve uma causa diferente da que foi indicada.

3.6.2 Efeito conjunto

Sustenta-se que uma coisa causa outra mas, de fato, são ambas o efeito de uma mesma causa subjacente. Esta falácia é muitas vezes apresentada como um caso especial de falácia post hoc ergo propter hoc.

Exemplos:

  1. Estamos a viver uma fase de elevado desemprego que é provocado por um baixo consumo. (De fato, ambos podem ser causados por taxas de juro muito elevadas.)
  2. Estás com febre e isso está a fazer com que te enchas de borbulhas. (De fato, ambos os sintomas são causados pelo sarampo.)

Prova: Identifique os dois efeitos e mostre que ambos são provocados pela mesma causa subjacente. É preciso indicar a causa oculta e provar que ela causa cada efeito.

3.6.3 Causa genuína mas insignificante

O objeto ou evento identificado como a causa de um efeito é uma causa genuína — mas insignificante quando comparada com outras causas desse evento. Note-se que não se trata desta falácia quando todas as outras causas são igualmente insignificantes. Não é falacioso dizer que a sua ajuda causou a derrota do partido do governo, porque o seu voto tem o mesmo peso de qualquer outro voto e, portanto, é igualmente parte da causa.

Exemplos:

  1. Fumar causa a poluição do ar em Edmonton. (É verdade mas o efeito do fumo do tabaco é insignificante comparado com o efeito poluente dos automóveis.)
  2. Deixando a tua fornalha acesa durante a noite contribuis para o aquecimento global do planeta.

Prova: Identifique uma causa mais significativa.

3.6.4 Tomar o efeito pela causa

A relação entre causa e efeito é invertida.

Exemplos:

  1. O cancro faz fumar.
  2. A propagação da SIDA foi provocada pela educação sexual. (De fato, o desenvolvimento da educação sexual foi provocado pela propagação da SIDA.)

Prova: Exponha um argumento causal, mostrando que a relação entre causa e efeito foi, de fato, invertida.

3.6.5 Causa complexa

O efeito é provocado por certo número de objetos ou eventos, dos quais a causa identificada é apenas um parte. Uma variante disto são os ciclos de feedback onde o efeito é ele mesmo parte da causa.

Exemplos:

  1. O acidente não teria ocorrido se não fosse a má localização do arbusto. (Certo, mas o acidente não teria ocorrido se o condutor não estivesse bêbado, e se o peão tivesse prestado atenção ao trânsito.)
  2. A explosão do Challenger foi causada pelo tempo frio. (Verdadeiro, mas não teria ocorrido se os anéis em o tivessem sido bem construídos.)
  3. As pessoas estão com medo por causa do incremento do crime. (Certo, mas as pessoas têm sido levadas a violar a lei em conseqüência do seu medo. O que ainda aumenta mais o crime.)

Prova: Mostre que todas as causas e não apenas aquela que foi mencionada são precisas para explicar o efeito.


3.7 Falhar o alvo

Estas falácias têm em comum o fato de falharem a prova de que a conclusão é verdadeira.

3.7.1 Petição de Princípio (petitio principii)

A verdade da conclusão é pressuposta pelas premissas. Muitas vezes, a conclusão é apenas reafirmada nas premissas de uma forma ligeiramente diferente. Nos casos mais subtis, a premissa é uma conseqüência da conclusão.

Exemplos:

  1. Dado que não estou a mentir, segue-se que estou a dizer a verdade.
  2. Sabemos que Deus existe, porque a Bíblia o diz. E o que a Bíblia diz deve ser verdadeiro, dado que foi escrita por Deus e Deus não mente. (Neste caso teríamos de concordar primeiro que Deus existe para aceitarmos que ele escreveu a Bíblia.)

Prova: Mostre que para acreditarmos nas premissas já teríamos de aceitar a conclusão.

3.7.2 Conclusão Irrelevante (ignoratio elenchi)

Um argumento prova uma coisa diferente da pretendida.

Exemplos:

  1. Deves aceitar a nova política de arrendamento. Não podemos continuar a ver pessoas a viver nas ruas, devemos ter rendas mais baratas. (Podemos pensar que é inaceitável ver pessoas a viver nas ruas e, no entanto, não estarmos de acordo com as novas rendas)
  2. A lei deve estipular uma percentagem mínima de mulheres nos cargos políticos, repartições e empresas. Os homens dominam praticamente todos os cargos importantes. Só uma sociedade discriminatória o pode suportar. Não fazermos nada para alterar esse estado de coisas é inaceitável. (Podemos concluir, com o argumentador, que a nossa sociedade é machista sem termos de aceitar que a discriminação positiva que ele propõe é a solução.)

Prova: Mostre que a conclusão apresentada pelo argumentador, com a qual até pode concordar, não é a conclusão que ele pretendia tirar.

3.7.3 Espantalho

O argumentador, em vez de atacar o melhor argumento do seu opositor, ataca um argumento diferente, mais fraco ou tendenciosamente interpretado. Infelizmente é uma das "técnicas" de argumentação mais usadas.

Exemplos:

  1. As pessoas que querem legalizar o aborto, querem prevenção irresponsável da gravidez. Mas nós queremos uma sexualidade responsável. Logo, o aborto não deve ser legalizado.
  2. Devemos manter o recrutamento obrigatório. As pessoas não querem o fazer o serviço militar porque não lhes convém. Mas devem reconhecer que há coisas mais importantes do que a conveniência.

Prova: Mostre que o argumento oposto foi mal representado, mostrando que os opositores têm argumentos mais fortes. Descreva um argumento mais forte.


3.8 Falácias da ambigüidade

As falácias desta secção são, todas elas, falácias geradas pela falta de clareza no uso de uma frase ou palavra. Há dois modos de isto suceder:

  1. A palavra ou frase pode ser ambígua, caso em que tem, mais de sentido distinto;
  2. A palavra ou frase pode ser vaga. Nesse caso não tem um sentido distinto.

3.8.1 Equívoco

A mesma palavra pode ser usada com dois significados diferentes.

Exemplos:

  1. Criminalidade é ilegalidade. O julgamento de um roubo ou assassínio são ações criminais. Os julgamentos de roubos e assassínios são designados de ações criminais. Logo, os julgamentos de roubos e assassínios são ilegais.
  2. Os assassinos de crianças são desumanos. Portanto, os humanos não matam crianças. (O argumento joga com os significados moral e descritivo de 'humano')
  3. Para ser grande ou pequeno um objeto tem, primeiro, de ser. Logo, o ser do objeto surgiu primeiro. (Jogo com o significados lógico e com físico de "ser")

Prova: Identifique a palavra que é usada mais de uma vez. Depois, mostre que a palavra surge com diferentes definições, adequadas num dos seus usos e inadequadas em outros.

3.8.2 Anfibologia

Uma anfibologia ocorre quando a construção da frase permite atribuir-lhe diferentes significados.

Exemplos:

  1. No teu emprego todos gostam de um carro. Portanto, há um carro muito especial. (Todos gostam de um carro qualquer ou do mesmo carro?)
  2. O Oráculo de Delos disse a Croseus que se ele continuasse a guerra destruiria um reino poderoso. (O Oráculo não disse que seria o seu próprio reino...)

Prova: Evidencie a ambigüidade da frase, mostrando que pode receber diferentes interpretações.

3.8.3 Ênfase

A ênfase é usada para sugerir uma proposição diferente daquela que, de fato, é expressa.

Exemplos:

  1. Não há CERVEJA GRÁTIS!
  2. A ex-namorada, procurando vingar-se do capitão, escreveu no jornal: "Hoje, o capitão estava sóbrio". (Ela sugere, com a ênfase, que habitualmente o capitão está bêbado.)


3.9 Erros categoriais

Estas falácias ocorrem porque o autor assume erroneamente que as partes e o todo devem ter propriedades semelhantes. No entanto, as coisas podem ter, como um todo, propriedades diferentes das que cada uma tinha em separado.

3.9.1 Falácia da composição

Por as partes de um todo terem certa propriedade, argumenta-se que o todo tem essa mesma propriedade. Esse todo pode ser tanto um objeto composto de diferentes partes, como uma coleção ou conjunto de membros individuais.

Exemplos:

  1. Cada tijolo tem três polegadas de altura, portanto a parede de tijolo tem três polegadas de altura.
  2. As células não têm consciência. Portanto, o cérebro, que é feito de células, não tem consciência.

Prova: Identifique o todo e as partes em questão. Mostre que, em geral o todo não têm de ter as propriedades das partes, ou, podendo ser mais específico, mostre que o todo em questão não tem as propriedades das partes.

3.9.2 Falácia da divisão

Como o todo tem certa propriedade, argumenta-se que as partes têm essa propriedade. O todo em questão, pode ser tanto um objeto como uma coleção ou conjunto de membros individuais.

Exemplos:

  1. A parede de tijolo tem 1,90 m de altura. Portanto os tijolos têm 1,90 de altura.
  2. Como o cérebro tem consciência, cada célula do cérebro deve ter a consciência.
  3. Como tudo tem uma causa, então há uma causa de tudo.
  4. Como todos têm uma mãe, então há uma mãe de todos.

Prova: Mostre que as propriedades em questão são propriedades das partes mas não do todo. Se for preciso, descreva as partes para mostrar que elas não têm as propriedades do todo.


3.10 Non-sequitur

O termo non sequitur significa literalmente "não se segue que". Nesta secção descrevemos falácias que ocorrem em conseqüência da forma de argumento usado ser inválida.

3.10.1 Falácia da afirmação da conseqüente

Esta falácia deriva da confusão entre condição suficiente e condição necessária. Por exemplo: dadas as proposições

P = Hitler levou com a bomba H.
Q = Hitler morreu.

Se admitir que P é verdadeira, concluirei que Q é verdadeira. P é suficiente para Q. Q é necessária para P (não há P sem Q). Mas, do facto de Q ser verdadeira, não posso concluir que P o seja (Q não é suficiente para P). Logo, todo o argumento com a seguinte forma é inválido:

Se P, então Q.
Ora, Q.
Logo, P.

Exemplos:

  1. Se jogamos bem, ganhamos. Ora, ganhamos. Logo, jogamos bem. (De fato jogamos mal, mas o adversário jogou pior e o árbitro ajudou)
  2. Se estou em Faro, estou no Algarve. Ora, estou no Algarve. Logo, estou em Faro. (Claro que posso estar em Olhão ou em Sagres.)
  3. Se a fábrica estivesse a poluir o rio, então veríamos o número de peixes mortos aumentar. Há cada vez mais peixes a morrer. Logo, a fábrica está a poluir o rio.

Prova: Mostre que, mesmo sendo as premissas verdadeiras, a conclusão pode ser falsa. Em geral basta mostrar que Q pode ser conseqüência de outra coisa que não P. Por exemplo, a morte dos peixes pode ser provocada pela aplicação de pesticidas e não pela fábrica.

3.10.2 Falácia da negação da antecedente

Nesta falácia confunde-se a condição suficiente com a condição necessária. Com uma frase condicional (Se P, então Q) dizemos que se P for verdadeira, Q também é; mas não dizemos que a recíproca é verdadeira. Por isso, os argumentos com a seguinte forma são inválidos:

Se P, então Q.
Não-P.
Logo, não-Q.

Exemplos:

  1. Se fores atingido por um carro quando tiveres 6 anos, morres jovem. Mas não foste atingido por um carro aos 6 anos. Portanto, não vais morrer jovem. (Claro que ele poderia ser atingido por um comboio com a idade de 6 anos e, nesse caso, morria jovem)
  2. Se estou em Faro, então estou no Algarve. Não estou em Faro. Logo, não estou no Algarve. (Mas pode estar em Olhão...)

Prova: Mostre que a conclusão pode ser falsa mesmo que as premissas sejam verdadeiras. Em particular, mostre que a conseqüente, Q, pode ocorrer mesmo que P não ocorra.

3.10.3 Falácia da inconsistência

O argumentador avança pelo menos duas proposições que não podem ser verdadeiras ao mesmo tempo. Em tais casos as proposições podem ser contrárias ou contraditórias.

Exemplos:

  1. Montreal está a cerca de 200 km de Otawa, enquanto Toronto está a 400 km de Otawa. Toronto está mais perto de Otawa do que Montreal.
  2. John é maior do que Jake, e Jake é maior do que Fred, enquanto Fred é maior do que John.

Prova: Parta de uma das afirmações e use-a como uma premissa para mostrar que a outra é falsa.


3.11 Falácias da explicação

Uma explicação é uma forma de raciocínio que tenta dar resposta à pergunta "Por quê?" Por exemplo: é com uma explicação que respondemos a uma pergunta como "Por que é que o céu é azul?" Uma boa explicação será baseada numa teoria científica ou empírica. A explicação do azul do céu será dada em termos da composição dos céus e das teorias da reflexão.

3.11.1 Invenção de fatos

Uma explicação pretende dizer-nos por que razão acontece certo fenômeno. A explicação é falaciosa se o fenômeno não ocorre ou se não houver prova de que possa ocorrer.

Exemplos:

  1. A razão da timidez da maioria das pessoas solteiras reside no carácter possessivo das suas mães. (É uma tentativa de explicar por que razão a maioria das pessoas solteiras são tímidas. No entanto, não é verdade que a maioria das pessoas solteiras sejam tímidas.)
  2. João entrou na loja porque queria ver a Maria. (Isto é uma falácia porque, de fato, João não entrou na loja.)
  3. A razão pela qual a maioria das pessoas se opõem à greve é o medo de perder o emprego. (Pretende-se explicar a oposição dos trabalhadores à greve. Mas suponha que eles votam a continuação da greve. Então não há, de fato, oposição à greve.)

Prova: Identifique o fenômeno que está a ser explicado. Mostre que não há razão para acreditar que o fenômeno tenha de fato ocorrido.

3.11.2 Distorcer fatos

Uma explicação pretende dizer-nos por que razão acontece certo fenômeno (fato). O fenômeno ou fato está estabelecido, o argumento visa estabelecer a explicação. Neste tipo de falácias, no entanto, apesar de algo semelhante ao fenômeno a explicar ter ocorrido, ele é falsificado, apresentado de forma parcial ou baseado em provas had-doc.

Exemplos:

  1. A timidez da maioria dos solteiros explica-se pelo caráter dominador das mães. (Pretende-se explicar a timidez da maioria dos solteiros. No entanto provou-se que o autor baseou a sua argumentação em dois solteiros que conheceu em tempos, sendo ambos tímidos... Isto está longe de ser artificial: é assim que muitas vezes formamos a nossa opinião sobre diversos grupos humanos)
  2. A razão pela qual obtenho boas classificações é que os meus alunos me apreciam. (Isto é uma falácia quando as avaliações com menos de 70% são eliminadas com a justificação de que os alunos não compreenderam a questão...)

Prova: Identifique o fenômeno que está a ser explicado. Mostre que as provas avançadas para afirmar a existência do fenômeno foram, de algum modo, manipuladas.

3.11.3 Irrefutabilidade

A teoria que foi avançada para explicar a ocorrência de algum fenômeno não pode ser testada. Testamos uma teoria por meio das suas previsões. Por exemplo, uma teoria pode prever que a luz muda de trajetória em certas condições, ou que um líquido muda de cor com o ácido, ou que um psicótico responda mal a certos estímulos. Se o evento previsto não ocorrer, então a informação obtida contradiz a teoria. Uma teoria não pode ser testada se não faz previsões. Também não pode ser testada se prevê acontecimentos que podem ocorrer independentemente de a teoria ser verdadeira.

Exemplos:

  1. Um avião desapareceu no meio do Atlântico devido ao efeito do Triângulo das Bermudas, uma força tão subtil que não pode ser medida por qualquer instrumento. (À "força" do Triângulo das Bermudas não se atribui mais nenhum efeito para além do desaparecimento ocasional de um avião. Por isso, a única previsão que permite é que mais aviões se irão perder. Mas isto é o que pode muito bem acontecer independentemente de a teoria ser verdadeira ou falsa. )
  2. Ganhei a lotaria porque a minha aura psíquica me fez ganhar. (Uma maneira de testar esta teoria é tentar ganhar de novo a lotaria. Mas a pessoa responde que essa aura só o faz ganhar uma vez. Não há, portanto, uma maneira de determinar se ganhou em resultado da aura ou do acaso.)
  3. A razão pela qual tudo existe é que Deus tudo criou. (Isto pode ser verdade, mas como explicação não tem qualquer peso porque não temos meios para testar tal teoria. Nenhuns fatos no mundo podem mostrar que esta teoria é falsa porque, de acordo com tal teoria, todos os fatos foram criados por Deus.)
  4. Ny Quil o fará dormir devido à sua fórmula calmante. (Quando pressionado, o fabricante definirá a "fórmula calmante " como "qualquer coisa que o faz dormir". Para testar esta teoria, teríamos de descobrir outra coisa que contivesse a fórmula calmante e verificar se ela faz dormir. Mas como encontramos alguma coisa que contenha a fórmula calmante? Procuramos por coisas que façam dormir! Mas nós podemos prever que as coisas que fazem dormir fazem dormir, não interessando o que a teoria diz. Esta teoria é vazia.)

Prova: Identifique a teoria. Mostre que ela não faz previsões, ou que as previsões feitas com a teoria são falsas ou que as previsões que ela faz podem ser verdadeiras mesmo que a teoria seja falsa.

3.11.4 Âmbito Limitado (ad-hoc)

A teoria só explica um fenômeno e nada mais.

Exemplos:

  1. Havia hostilidade em relação aos hippies dos anos 60 por causa do ressentimento dos seus pais em relação às crianças. (Esta explicação é deficiente porque explica a hostilidade em relação aos hippies e nada mais. Uma teoria melhor seria dizer que havia hostilidade em relação aos hippies porque os hippies são diferentes, e as pessoas temem coisas diferentes. Esta teoria explicaria não só a hostilidade em relação aos hippies, mas também outras formas de hostilidade.)
  2. As pessoas tornam-se esquizofrênicas porque as diferentes partes dos eu cérebro funcionam separadas. (Esta teoria explica a esquizofrenia e nada mais.)

Prova: Identifique a teoria e o fenômeno que ela explica. Mostre que a teoria não explica nada mais. Argumente que as teorias que só explicam um fenômeno são, na melhor das hipóteses, incompletas.

3.11.5 Pouca profundidade (superficialidade)

As teorias explicam os fatos apelando a causas ou fenômenos subjacentes. As teorias que não apelam a causas subjacentes e apenas apelam à pertença a uma categoria (apenas incluem o fenômenos em uma classe de fenômenos) são superficiais.

Exemplos:

  1. A minha gata gosta de atum porque é uma gata. (Esta teoria apenas afirma que os gatos gostam de atum, sem explicar este fato.)
  2. Ronald Reagan era militarista porque era americano. (Certo, ele era americano. Mas, em que é que o fato de ser americano o torna militarista? O que o levou a agir dessa maneira? A teoria não nos diz isso e, portanto, não nos dá uma boa explicação.)
  3. Estás a dizer isso só porque pertences ao sindicato. (Esta tentativa de rejeição do argumento pretende explicar o comportamento do opositor como manifestação de frivolidade. Falha, no entanto, porque não é uma explicação. Suponhamos que toda a gente do sindicato dizia o mesmo. E daí? Tínhamos de ir mais fundo — tínhamos de perguntar por que razão toda a gente do sindicado dizia isso, antes de podermos concluir que as afirmações do opositor são frívolas.)

Prova: As teorias desta espécie tentam explicar um fenômenos, mostrando que ele é parte de uma classe ou categoria de fenômenos semelhantes. Aceitando esse fato, exija uma explicação mais vasta para os fenômenos dessa categoria. Argumente que uma teoria explicativa deve referir causas e não apenas classificações.


3.12 Erros de definição

Usamos definições para tornar os nossos conceitos mais claros. O propósito da definição é enunciar com exatidão o significado de uma palavra. Uma boa definição deve permitir que o leitor a aplique a casos concretos sem ajuda exterior. Por exemplo, suponhamos que queremos definir a palavra "maçã". Se a definição for bem sucedida, então o leitor deve poder aplicá-la a cada maçã que existe e só a maçãs. Se o leitor falhar algumas maçãs ou incluir outros objetos (como pêras) ou não puder dizer se algo é maçã ou não, então a definição falha. As definições não são argumentos. Por isso, não se pode, com rigor, falar de "Falácias da Definição". Mas as definições incorretas, por vezes tendenciosas, são muitas vezes incluídas em argumentos tornando-os falaciosos.

3.12.1 Definição demasiado lata

A definição inclui mais do que devia incluir.

Exemplos:

  1. Uma maçã é um objeto vermelho e redondo. (O planeta Marte é vermelho e redondo. Portanto está incluído na definição. Mas é óbvio que Marte não é uma maçã.)
  2. Uma figura é quadrada se e só se tiver quatro lados de igual comprimento. (Não são só quadrados que têm quatro lados de igual comprimento. Os losangos também.)

Prova: Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Procure um objeto que preencha as condições da conclusão, mas que obviamente não seja uma instância do termo a definir.

3.12.2 Definição demasiado restrita

A definição não inclui tudo o que deveria incluir.

Exemplos:

  1. Uma maçã é algo vermelho e redondo. (Há muitas maçãs, e deliciosas maçãs, que, não sendo maçãs vermelhas, não estão incluídas na definição e deveriam estar.)
  2. Um livro é pornográfico se e só se contiver fotografias de pessoas nuas. (Os livros escritos pelo Marquês de Sade não contêm fotografias. No entanto, são tidos como pornográficos. Portanto, a definição é demasiado limitada.)
  3. Uma coisa é música se e apenas se for tocável num piano. (Um solo de bateria não pode ser tocado num piano e, no entanto, não deixa de ser música.)

Prova: Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Apresente um item que seja uma instância do termo mas não preencha essas condições.

3.12.3 Definição pouco clara

A definição é tão ou mais difícil de compreender do que o termo a definir.

Exemplos:

  1. Uma pessoa é dissoluta se e só se for lasciva. (Pretende-se definir o termo "dissoluta". Mas o significado do termo "dissoluta" é tão obscuro como o do termo "lasciva". Assim a definição falha o seu objetivo de clarificação.)
  2. Um objeto é belo se e só se for esteticamente bem sucedido. (O termo "esteticamente bem sucedido" é mais difícil de compreender do que o termo "belo".)

Prova: Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Mostre que as condições não estão mais claramente definidas do que o termo a definir.

3.12.4 Definição circular

A definição inclui o termo definido como parte da definição. Uma definição circular é um caso especial da falta de clareza.

Exemplos:

  1. Um animal é humano se e só se tem pais humanos. (Pretende-se definir "humano". Mas para encontrarmos um ser humano temos de encontrar pais humanos. Para encontrarmos pais humanos temos já de saber o que o que é um ser humano.)
  2. Um livro é pornográfico se e só se contiver pornografia. (Teríamos já de saber o que é a pornografia para dizer se um livro é ou não pornográfico.)

Prova: Identifique o termo que está a ser definido. Identifique as condições da definição. Mostre que pelo menos um termo usado nas condições é o mesmo que o termo que está a ser definido.

3.12.4.1 Egocentrismo ideológico

Essa provavelmente não será achada em manuais de lógica. Nada mais é do que um primo do raciocínio circular. Trata-se da incapacidade ou recusa sistemática em se pôr de um ponto neutro para analisar alguma coisa. O cerne do problema, aqui, é mais a atitude do debatedor do que propriamente sua lógica. Mais uma vez, recorramos a exemplos reais e muito comuns:

“Como eu sei que a Bíblia contém toda a Palavra de Deus, perfeita e eterna? Ora, porque, conforme vemos em Segunda Timóteo 3:16...”

O erro é recorrer àquílo que está sendo questionado.

Apelar ao fato sob questionamento, que só é reconhecido por uma das partes é sempre desaconselhável quando a finalidade é a persuasão.

Em matérias científicas, por exemplo, o currículo de alguém pode dar uma boa idéia de sua capacidade para opinar sobre um assunto. Em religião tal não se aplica da mesma forma. Por isso, é sempre bom recorrer a outros argumentos. Impor o fato sob questionamento simplesmente não é correto.

3.12.5 Definição contraditória

A definição é auto-contraditória.

Exemplos:

  1. Uma sociedade é livre se e só se a liberdade for maximizada e as pessoas forem legalmente obrigadas a tomar a responsabilidade das suas acções. (As definições deste tipo são muito comuns, especialmente na Internet. Mas, se uma pessoa for legalmente obrigada a fazer alguma coisa, já não podemos dizer que a liberdade foi maximizada.)
  2. As pessoas podem candidatar-se à carta de condução se:
    (a) não tiverem experiência anterior de condução
    (b) tiverem acesso a um veículo, e
    (c) tiverem operado veículos motorizados
    (Uma pessoa não pode ter operado veículos motorizados se não tiver experiência prévia de condução)

Prova: Identifique as condições da definição. Mostre que nem todas podem ser, ao mesmo tempo, verdadeiras. Em particular, parta de uma das condições e, depois, mostre que uma das outras é falsa).

3.13 Acentuação / Ênfase

A falácia a Acentuação funciona através de uma mudança no significado. Neste caso, o significado é alterado enfatizando diferentes partes da afirmação. Por exemplo:

“Não devemos falar mal de nossos amigos”

“Não devemos falar mal de nossos amigos

Seja particularmente cauteloso com esse tipo de falácia principalmente em textos, onde é fácil interpretar mal o sentido do que está escrito.

4 SOFISMA

Um sofisma (do grego antigo "fazer raciocínios capciosos") em Filosofia é um raciocínio aparentemente válido, mas inconclusivo, pois é contrário às suas próprias leis. Também são considerados sofismas os raciocínios que partem de premissas verdadeiras ou verossímeis, mas que são concluídos de uma forma inadmissível ou absurda. Por definição, o sofisma tem o objetivo de dissimular uma ilusão de verdade, apresentado-a sob esquemas que parecem seguir as regras da lógica.

Historicamente o termo sofisma, no seu primeiro e mais comum significado, é equivalente ao paralogismo matemático, que é uma demonstração aparentemente rigorosa que, todavia, conduz a um resultado nitidamente absurdo. Atualmente, no uso freqüente e do senso comum, sofisma é qualquer raciocínio caviloso ou falso, mas que se apresenta com coerência e que tem por objetivo induzir outros indivíduos ao erro mediante ações de má-fé.

Para ilustrar, mostramos a seguir um exemplo de sofisma bastante conhecido: O problema de Deus e da Pedra.

"Deus, o todo poderoso, foi desafiado a criar uma pedra tão pesada que nem ele pudesse carregar. Ele aceitou o desafio, mas logo percebeu que se criasse essa pedra estaria impossibilitado de levá-la, deixando de ser todo poderoso. Por outro lado, se não fosse capaz de criar tal pedra deixaria de ser todo poderoso também."

O sofisma tem como objetivo induzir a audiência ao engano, o raciocínio falacioso decorre de uma falha de quem argumenta. Quem usa sofismas, sabe o que está fazendo quando, por exemplo, tenta nos empurrar uma conclusão para a qual não dispõe de dados ou demonstrações suficientes. Quem se vale de falácias, por sua vez, simplesmente se enganou.

4.1 Classificação dos sofismas

4.1.1 Sofismas formais e materiais

Um sofisma é formal se as premissas que o sustentam são válidas e se sua falsidade derivar do mau uso das regras de inferência lógica.

Um sofisma é material se resultar falso mesmo sendo validado pelos critérios da lógica formal. Sua falsidade vem da falsidade das premissas.

4.1.2 Sofisma de indução

Algumas vezes as premissas resultam de induções, por isso tradicionalmente fala-se nos sofismas de indução, que resultam de premissas mal-induzidas. Existem sofismas de indução cuja invalidade é aceita sem maiores discussões, devido à simplicidade com que se prova o erro de indução.
A questão começa a ficar complexa quando nos avizinhamos de questões-limite da epistemologia, como as que estabelecem em que condições são válidas as induções amplificadoras, que são as induções típicas praticadas pelos cientistas.
Uma indução amplificadora é aquela que extrapola suas conclusões para além daquilo que foi observado.
Também é preciso considerar que a qualidade de uma indução depende do estágio em que se encontra o conhecimento da objetividade. O enunciado 'A Terra é o centro do Universo' já passou por boa indução.
O sofisma de Zenão é clássico para ilustrar que certos sofismas de indução só são desmontados com o avanço do conhecimento. Pelo sofisma de Zenão se afirma que o movimento é impossível supondo que para percorrer uma distância é necessário, primeiramente, percorrer a metade da distância.
Ora, percorrida metade da distância será necessário percorrer metade da distância restante e assim sucessivamente, de modo que para cobrir uma distância será necessário realizar uma seqüência infinita de etapas.
Na época em que Zenão lançou seu sofisma não haviam sido formuladas as noções de continuidade, de infinitésimo e outras noções que podem ser usadas para desmontar o sofisma. Hoje podemos afirmar que o movimento é contínuo e não discreto, que para percorrer infinitos espaços infinitesimais não é necessário um tempo infinito.
Em função das dificuldades epistemológicas envolvidas em afirmar o que é uma indução malfeita, aqui não se faz referência a sofismas de indução, exceto o da falsa analogia, que é apresentado apenas formalmente.

4.2 Tipos de sofismas

Os tipos a seguir são os mais notáveis.

4.2.1 Contrariedade camuflada

Consiste na conjunção de proposições em que a aceitação de uma implica na negação da outra, sem que isto seja visível de imediato.

camuflagem acontece quando:

  • a premissa que revela a contrariedade é desconhecida ou desconsiderada pelo receptor;

  • a revelação da contrariedade exige o estabelecimento de uma seqüência longa de implicações;

  • a contrariedade é sutil e exige atenção para detecção;

  • há distanciamento entre as proposições contrárias, de modo que a memória da primeira já tenha se desvanecido ao ser apresentada a segunda.

A contrariedade camuflada difere da contrariedade flagrante e do oxímoro. Da primeira, pela própria camuflagem e do segundo pela impossibilidade de aplicação do algoritmo para oxímoro.

Os enunciados contrários de um sofisma de contrariedade têm de estar explícitos no discurso para que se caracterize o sofisma unicamente pela análise do discurso.

Uma relação de contrariedade entre as proposições A e B pode ser expressa pela sentença: 'se A então não B e, se B, então não A'.

O sofisma da contrariedade camuflada se resume à fórmula 'A é B'. A falsidade se aplica à conjunção. Obviamente uma das duas proposições, A ou B, em separado, pode ser verdadeira.

As contradições têm a forma 'A é não A'. Assim, qualquer contradição também é uma contrariedade. O que se disse sobre sofismas de contrariedade pode ser dito sobre sofismas de contradição camuflada.

4.2.2 De possibilidades

São proposições que se referem a fatos objetivos. Elas podem declarar o impossível e o possível. O possível pode ser improvável, provável e certo. Os sofismas de possibilidade confundem essas noções.

Os sofismas de possibilidade confundem as noções. Exemplos:

Tudo o que é improvável é falso, impossível.

Tudo o que é provável é certo, verdadeiro.

4.2.3 De implicação

Consiste basicamente em dizer que X implica Y, quando na verdade isto não ocorre. Argumento que prova tese usa premissas que não a implicam. Como: Se X implica Y, então Y implica X. Se X implica Y, então não X implica não Y. Se X implica Y, então não Y implica não X. Se a tese é verdadeira, então as premissas também são. Se a tese é falsa, então as premissas também são. Se X é contíguo a Y, então X implica Y.


4.2.4 Transferência de credibilidade

Uma proposição é considerada boa porque vem de uma boa fonte ou má se vem de fonte ruim. Esta fonte pode ser a tradição, a posição da autoridade, a maioria, etc.
Esse tipo de sofisma é também sofisma de implicação, pois considera que a autoridade da fonte implica na veracidade do enunciado.

Ex. Isso é verdade porque foi o Papa quem disse.

4.2.5 Estatísticos

A qualidade do indivíduo é considerada a qualidade média do grupo.

Ex. Ele tirou 10 na prova logo o grupo foi bem.

4.2.6 Falta de prova em contrário

A proposição é considerada verdadeira se não houver prova de sua falsidade e vice-versa.

Ex. Não há provas de que Deus não exista, logo sua existência é verdadeira.

4.2.7 Falsa analogia

Consiste no transplante inconsistente de conclusões de um contexto para outro. A falsa analogia extrapola a similaridade entre duas situações para além da sua validade.

Exemplo: 'Tirando-lhe um cabelo não ficará calvo, tampouco tirando-lhe dois ou três. Do mesmo modo não ficará calvo se lhe tirarem todos os cabelos'. Aqui extrapola-se o que é válido para um, dois e três cabelos para o total de cabelos.

4.2.8 Sofisma de quantificação

São os ligados à declarações de existência.

Existe indivíduo que atende à proposição, então todo indivíduo atende à proposição.

Nem todo indivíduo atende à proposição, então nenhum indivíduo atende à proposição.

Os sofismas de possibilidade e de quantificação poderiam ser chamados de sofismas de arredondamento e enunciados do seguinte modo:

O que está próximo de zero ou próximo de 100% pode ser arredondado para zero e 100% respectivamente.

4.2.9 Sofisma do maniqueísmo

A confusão no sofisma de maniqueísmo consiste em tomar por relação de contrariedade complementar o que é contrariedade simples.

Sejam X e Y proposições pertinentes num mesmo domínio e não complementares. O sofisma do maniqueísmo se expressa como:

Se X, então não Y. Se não X, então Y.

O enunciado verdadeiro seria:

Se não X, então Y ou A ou B ou C .


4.2.10 Composição ou divisão

São os sofismas que atribuem ao todo o que é próprio das partes ou às partes o que é próprio do todo.

Ex. O todo é pesado. As partes são pesadas.

As partes são leves. O conjunto é leve.

4.2.11 Petição de princípio

É o argumento que prova a tese assumindo a sua veracidade como premissa. A petição de princípio é um argumento inválido, o que significa que não é possível provar a proposição com ele, o que não impede a proposição de ser verdadeira.
A petição de princípio eficaz como sofisma sempre envolve camuflagem. Nestes casos é preciso estabelecer uma cadeia de implicações para desmontar a petição de princípio.

4.2.12 Sofismas semânticos

Consistem em confundir o receptor quanto ao sentido em que dado termo é usado. Há muitas possibilidades:

Atribuir ao comparado, num recurso de retórica semântico, características do comparante que não são pertinentes a ambos ou vice-versa.

Numa palavra polissêmica que se refere ao conceito A ou ao conceito B atribuir ao conceito A as características do conceito B, ou vice-versa.

Exemplo: 'Não conheces este homem velado. É teu pai, logo, não conheces teu pai'. Aqui há dois sentidos para conhecer. O sofisma só funciona quando se opta por um nas duas ocorrências.

Num termo que admite leitura imediata e leitura figurada atribuir ao conceito evocado pela leitura figurada características do conceito evocado pela leitura imediata e vice-versa.

Atribuir ao termo conotações diferentes no mesmo contexto. Este sofisma ocorre muito nas críticas filosóficas. Parte-se das características de um termo tais quais elas são num contexto A para critica-las num contexto B, no qual o conceito a que se refere o termo sofreu mutação.

Tomar o signo ora como signo mesmo, ora como significado, ora como significante. Confunde-se uso com menção.

Exemplo: 'Racismo é só uma palavra. Não há por que discutir sobre palavras. Não há porque discutir racismo.'

Um sofisma semântico não deve ser confundido com ambigüidade. A ambigüidade se caracteriza pela possibilidade de pelo menos dois sentidos para o mesmo enunciado, sendo a escolha por um dos sentidos questão indecidível no contexto. No sofisma semântico temos um só sentido, que é falso, mas aparentemente verdadeiro, em que a ilusão vem de se tomar um termo num sentido quando se deveria tomá-lo em outro. Caso se opte por atribuir ao enunciado o sentido que anula o sofisma, o resultado é uma anomalia.

4.2.13 Sofismas de conjunção e disjunção

Atribui-se a um termo o que só pode ser atribuído quando em conjunção com outro.

Exemplo: 'Quem faz mal a outro merece punição. Quem transmite doença contagiosa faz mal ao outro, logo deve ser punido'. Neste caso o termo 'fazer mal' só é pertinente ao enunciado se estiver em conjunção com o termo 'intencionalmente'.

Exemplo: 'O que se compra no mercado, come-se. Comprei carne crua. Comerei carne crua'. O que falta à primeira premissa é a conjunção com o enunciado: 'mas não tal qual vem'.

4.2.14 Sofismas em outras lógicas

Os sofismas acima foram considerados à luz da lógica bivalente do falso e do verdadeiro. Se admitirmos que os enunciados têm uma probabilidade associada a eles, verdadeiro na lógica bivalente é o enunciado que tem probabilidade de 100% e falso todo enunciado com probabilidade menor que 100%.

Há quatro classificações para os enunciados:

  • Certo: enunciado com probabilidade l.

  • Provável: enunciado com probabilidade maior ou igual a 0,5 e menor que l.

  • Improvável: enunciado com probabilidade menor que 0,5 e maior que 0.

  • Impossível: enunciado com probabilidade igual a zero.

O limite entre o provável e o improvável é arbitrário.

Os enunciados também podem ser classificados como fortes ou fracos: fracos são os impossíveis e os improváveis e fortes são os prováveis e os certos.

Em um quadro-resumo temos:

  • Certo = Forte = Verdadeiro

  • Provável = Forte = Falso

  • Improvável = Fraco = Falso

  • Impossível = Fraco = Falso

O enunciado 'Ele está mentindo porque é um mentiroso contumaz' é falso na lógica bivalente F/V, é um sofisma ad hominen, mas se a premissa que o sustenta é verdadeira, ou seja, se ele é realmente mentiroso contumaz, então o enunciado é certo ou provável, logo é forte.

Também pode-se considerar que o enunciado é uma simplificação por analogia de: 'Ele deve estar mentindo porque mentiu sempre em situações semelhantes.'

Há certos contextos em que decisões devem ser tomadas a partir da análise de enunciados como o anterior. Nesses contextos, a dicotomia falso/verdadeiro nem sempre é a ideal para balizar a decisão. Pode ocorrer que a dicotomia forte/fraco seja mais conveniente. Nesta direção, o enunciado sobre o mentiroso contumaz deixa de ser sofismático.


5 CONCLUSÃO

O conhecimento do que é ou não um raciocínio falacioso certamente é um dos mais úteis que existem quando vamos analisar criticamente qualquer assunto.
As falácias e inconsistências lógicas abundam em nossa sociedade e são utilizadas o tempo todo, como podemos verificar facilmente nos pronunciamentos de políticos demagogos, entre outros casos.
Elas permitem que alguém faça declarações aparentemente racionais e aceitáveis sem o mínimo necessário de conhecimento ou ainda fugindo de um tema e embaraçando os interlocutores, fazendo-os se desviarem do assunto tratado.
Reconhecê-las nem sempre é fácil, especialmente quando aparecem em diálogos, onde podemos acabar engolindo coisas que, uma vez submetidas a uma análise mais profunda, se revelam sem fundamento.
Existem áreas, até, onde uma falácia acaba se tornando o discurso predominante pelo qual um determinado grupo se manifesta.
Na área de que ora estamos tratando, a religiosa, não é demais dizer que é o campo onde mais se cometem esses erros. Portanto, não é de se admirar que determinadas pessoas sejam resistentes aos assuntos religiosos. Há a simples recusa em se aceitar como verdades absolutas afirmações e raciocínios que violam a própria lógica.
É importante notar que existem falácias de tal forma cristalizadas em certos grupos ou comunidades, tão repetidas e consagradas no seu discurso, que dificilmente terão sua falsidade reconhecida. Em se tratando de assuntos religiosos, isso se complica, pois o que é uma falácia para um, pode ser uma verdade irretorquível para outro.


BIBLIOGRAFIA

http://criticanarede.com/falacias.htm

http://pt.wikipedia.org/wiki/Fal%C3%A1cia

http://www.ateus.net/artigos/ceticismo/logica_e_falacias.php

http://www.str.com.br/Scientia/falacias2.htm#affirm

http://pt.wiktionary.org/wiki/Discuss%C3%A3o:Sofisma

http://www.radames.manosso.nom.br/retorica/sofistica.htm



3 comentários:

Luiz Fernando Zadra disse...

Gostaria de saber porque vc citou o problema de Deus e a Pedra como sofisma. A meu ver, esse problema não é um sofisma, e sim, a exemplificação de um paradoxo. Ele demonstra que a onipotência não pode existir, visto que ela cria situações insolúveis.

Elyson Scafati disse...

Sim é um paradoxo, porém se enquadra nos sofismas, visto que a existência de deus é algo duvidoso e vc cerca a situação de modo insolúvel em uma armadilha lógica.

É tal como o argumento invocado por religiosos para dizer que ateus são crentes - A crença na descrença.

Onipotência é poder tudo e este paradoxo o u sofisma realmente demonstra que ela não pode existir. Concordo contigo.

O mesmo vale para onipotencia e oniciência.

Se eu sei tudo o que acontecerá e não posso mudar isso não sou onipotente. Mas se sei o que acontecerá e se eu posso mudar, a ideia anterior que eu tinha sobre o que aconteceria era falsa, logo não sou oniciente.

São duas qualidades incompatíveis.

Rafael disse...

Gostei muito do texto, parabens por juntar as ideias de um modo de facil compreensão e ótima discussão, parabéns