Hoje um texto me chamou muito a atenção. O encontrei aqui e decidi fazer o abominável: copiar e colar.
É um texto fantástico a respeito do pensamento de um crente e teólogo que discorre a respeito de ciência e religião, mais especificamente do embate entre ambas, o qual, segundo sua concepção inexiste, uma vez que ambas pertencem a mundos distintos.
Este texto deveria ser lido e relido várias vezes pelos fundamentalistas religiosos a fim de que aprendessem a separar os mundos do ser e o do dever ser. Não há necessidade de se provar a veracidade das crenças religiosas em detrimento da ciência.
A ciência corresponde à natureza do mundo, enquanto a religião se volta à espiritualidade e a experiência para uma vida menos ruim.
Tomei a iniciativa de grifar os pontos que mais me chamaram a atenção.
Texto - Ciência e religião: A Tempestade Artificial
por Francis Clark (texto de um teólogo e crente traduzido e resumido pelo Prof. Fabrício R. Santos)*
Enquanto a batalha entre o criacionismo e a teoria evolutiva darwiniana continua a ser empreendida, especialmente dentro da rede de ensino dos E.U.A., nós poderíamos facilmente acreditar que há um conflito inerente entre uma crença em Deus e uma "crença" na ciência.
Contudo uma competição entre estas duas disciplinas nem sempre existiu, nem há realmente um conflito hoje. Contrariamente, a competição observada é o produto de uma visão distorcida da religião que nós criamos no mundo ocidental.
A fim de colocar esta tempestade falsa em perspectiva, primeiro necessitamos lembrar que alguns de nossos cientistas mais eminentes expressaram uma crença em uma força divina. Não se vêem avessos à religião, ao contrário, vêem seu trabalho, na frase de Stephen Hawking, como uma tentativa "de perscrutar dentro da mente de Deus." Mas esta não é a visão da ciência mantida por muitos dos membros de nossa sociedade.
De fato, nossa sociedade geralmente tende a ver o cientista tão rigorosamente lógico e o religioso como uma pessoa de mente aberta. Enquanto isto é certamente questionável, muitos daqueles que professam suas opiniões fundamentalistas mais alto são menos cultos (e são também irritantemente impenetráveis à lógica), enquanto outros com uma forte crença, são cultos e inteligentes. Eles simplesmente desenham uma linha artificial em torno das "verdades" de sua religião e não permitem que a ciência a ultrapasse.
O problema essencial que cria este conflito aparente é uma confusão das realidades completamente diferentes em que a religião e a ciência devem operar. A ciência trata do exame da realidade física tal como a gravidade, a eletricidade, a mecânica quântica, a química, etc.
A religião trata do que pode ser denominado "realidade espiritual", isto é, aquelas coisas que têm que haver com o espírito humano e a psique, com o próprio significado da vida humana, com valores individuais e sociais e com o mito.
Como estas realidades se confundiram é uma história de centenas de anos atrás embasada no Cristianismo do Ocidente. Mas esta história precisa ser contada a partir de uma época anterior, a fim de fornecer uma melhor perspectiva.
A ciência e o método científico foram inventados pelos gregos antigos no contexto de uma sociedade que era muito mais religiosa do que nossa própria.
Os gregos não encontraram na perseguição da ciência algo para reforçar a crença em sua religião, porque não tiveram nenhum dogma estático a obstruir ou opôr ao inquérito científico. Para eles, o universo era o projeto dos deuses.
Descobrir mais sobre o universo era saber mais sobre os deuses. Para os gregos, bem com para muitas outras culturas antigas, as diferentes percepções da mente, o lógico e o espiritual, eram complementares. Cada um tem sua própria esfera de operação e cada ser humano diferente encontra aquilo que necessita.
Movendo para o início da época romana, a definição da religião e seu lugar na sociedade são feitos de uma maneira mais clara e uniforme. É do latim o termo "religião ", relacionado especificamente à palavra "religar", uma "reverência aos deuses." O termo foi usado também para significar "os ritos e cerimônias, assim como o sistema inteiro da religião e da adoração".
A religião foi conseqüentemente algo que amarrou os povos romanos em um grande império. Esta situação mudou drasticamentos nos séculos terceiro e quarto, culminando no estabelecimento do Cristianismo como a religião oficial de Roma. Com essa nova situação, toda a estrutura religiosa ocidental foi mudada.
O Cristianismo não era uma religião que admitisse divergências de opinião. Os não cristãos deveriam ser convertidos ou punidos na Inquisição. Este estabelecimento do dogma foi uma etapa crítica na mudança da natureza da religião. Em vez de unir os povos, separou-os ainda mais.
O dogma foi usado para definir aqueles que eram puros, isto é, aqueles que aderiam ao cristianismo e aqueles que não. O dogma teve suas razões políticas no Cristianismo, mas é importante notar que uma definição dogmática da religião é uma característica normal de qualquer tipo de fé monoteística. Os princípios dogmáticos foram usados para testar a fé em várias ocasiões.
O Cristianismo ocidental não parou com a criação do dogma espiritual, também se espalhou ocasionalmente nas ciências. De sua concepção que tinha de si mesmos como sendo "possuidores da verdade", o Cristianismo expandiu o conceito de sua própria esfera do conhecimento. Fazendo assim, alcançou áreas que não diziam respeito ao espírito humano, mas sobre a realidade física.
Por séculos isto criou pouco problema, porque a igreja era a detentora de muito da pesquisa científica feita pelos Gregos e pelos Romanos. Mas, porque as ciências renasceram no ocidente, a igreja encontrou-se em conflito com Galileu e Copérnico, cujas experiências e observações desafiaram os pronunciamentos da igreja.
A igreja tinha colocado a Terra no centro do universo, porque o homem era criação adorada de Deus! Assim a linha da batalha entre o Cristianismo ocidental e as ciências foi desenhada muitos séculos atrás. A disputa evolução e criacionismo é somente a batalha atual. As outras batalhas, tais como a crença de que o Sol circundava a Terra, foram perdidas há muito tempo.
O problema é que o Cristianismo frequentemente não funciona como uma religião. O objetivo de criar uma experiência espiritual e mística é secundário ao desejo de reforçar uma adesão dos fiéis ao dogma.
O cristianismo substituiu conseqüentemente o núcleo místico da religião pelo dogmático. O mito não é mais incluído da mesma forma no ensino da religião. Enquanto o Cristianismo conservador desperdiça sua energia em batalhas contra o conhecimento gerado pela ciência, presta menos e menos atenção às necessidades espirituais de seus seguidores.
Os componentes principais do cristianismo também perderam a habilidade de encontrar-se com as necessidades de seus devotos.
A sociedade ocidental se vê limitada em encontrar suas necessidades espirituais, primeiramente porque perdeu a percepção correta da religião. A moeda corrente forjada de uma religião dogmática, interessada na promoção do dogma como um fato, diminuiu muito a dimensão desta própria religião.
Quando criança, eu fui exposto felizmente ao mito e ao Cristianismo. Hoje, quando necessito ajuda e tento recuperar a nobreza e o valor inerentes de cada vida humana, não é minha formação cristã que me sustenta. Ao contrário, são os contos antigos sobre Zeus e Hermes, disfarçados como camponeses deficientes que andam ao longo de uma estrada. Várias casas ricas negaram-lhe ajuda quando pediram alimento e abrigo.
Mas um casal de velhos, com pouco alimento para sustentar-se, teve piedade dos viajantes deficientes e deu-os o que poderia. Naturalmente, as recompensas do velho casal foram imensas. Mas essa lição da infância, aquela que eu não devo julgar o mérito de uma pessoa a partir do que se vê nela, permanece comigo.
E Prometeu, Afrodite, Aquiles e Ulisses estão em minha memória também. Aprendi com a lealdade do cão, com a devoção da esposa, com a nobreza de Ulysses e com o sacrifício de Prometeu. Aprendi que mesmo o mais invulnerável não deve ser demasiado arrogante, já que todos temos um "calcanhar de Aquiles".
A finalidade da religião é elevar a nobreza do espírito dentro da humanidade e ensinar-nos que há uma "justiça" no universo. Esta finalidade é encontrada com o mito, não com o dogma.
Ou, nas palavras de Joseph Campbell, "o mito não fornece o significado da vida, ele fornece a "experiência de estar vivo".
Discutir o criacionismo em oposição à evolução darwiniana não tem nada a ver com a validade ou força da religião.
Como um crente e religioso, eu não estou preocupado em negar a verdade da evolução biológica. Os "deuses" tiveram o direito de dar forma ao universo da maneira que escolheram.
* este texto é uma visão particular deste teólogo sobre o papel da Ciência e da Religião.
[NOTA] Para mim este texto é simplesmente fantástico! Faço minhas as palavras de Francis Clark e agradeço ao professor Fabrício do ICB da UFMG pela brilhante tradução e a conseqüente possibilidade de poder brindar a tosdos nós com o brilhante pensamento de Clark.
Que o texto sirva de lição aos fundamentalistas religiosos, principalmente os cristãos a fim de que revejam seus conceitos e separem o mundo da ciência daquele da religião, das crenças e dos mitos.
Um comentário:
Realmente muito bem colacadas as posições que gostariamos de tomar, mas muitas vezes não enontramos a linha de pensamento do respeito ao conhecimento que os dois lados representam. Mais um excelente trabalho de pesquisa do blog.
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