segunda-feira, 22 de março de 2010

Ainda a Verdade Absoluta - Parte I

Introdução:

Mais uma vez em uma tentativa sem qualquer sentido, seguidores do fundamentalismo cristão saem em busca da verdade absoluta. Os textos foram escritos pelo Sr. Jean Habkost e seguem abaixo:

Linha Editorial - 3ª Parte
Linha Editorial - 4ª Parte

Porém, não definem o que é verdade absoluta, sem trazer qualquer exemplo do que se trata o objeto desta busca. Dessa forma, os quatro textos acima citados não passam de retórica vazia.

De acordo com os textos o Sr. Jean faz uma confusão sem precedentes, entre os dois tipos de lógica (a formal e a dialética) e no que concerne ao exame do que é a verdade, temas estes que serão analisados em tópico respectivo.

Também será feito um apanhado referente à teoria dos sistemas sociais de acordo com o pensamento luhmanniano e onde esta tese se conecta com a questão da verdade relativa a cada sistema.


A lógica:

De início, a fim de entendermos o que é verdade, devemos conhecer a lógica e do que trata esta disciplina.

A lógica divide-se em duas vertentes:

1 - Lógica formal:

Esta lógica estuda o pensamento em sua estrutura formal, ou seja, quanto à forma.

Na lógica formal, ocorrem os seguintes princípios:

da identidade (se uma idéia é verdadeira então ela é verdadeira);

da não contradição (não é possível a idéia ser verdadeira e falsa);

do terceiro excluído (uma idéia ou é verdadeira ou é falsa).


Mas, estes princípios estão fora do tempo, sendo que se aplicam a coisas ideais e intertemporais. Tal sistemática exclui os movimentos relacionados às coisas pensadas, excluindo a história e a evolução do pensamento e do conhecimento.

Para tecermos um raciocínio lógico válido, nossas premissas devem ser verdadeiras e nossa conclusão também. Mas, os testes de veracidade destas premissas estão ao cargo do cientista e não do lógico.

Quanto ao quadro de oposições, tembém denominado de quadrado lógico, é ele quem estabelece as relações entre proposições categóricas.
















As proposições categóricas afirmam algo sobre duas classes, incluíndo ou excluíndo total ou parcialmente, uma classe da outra.

Ex. todo o homem é mortal.

Aqui, a classe homem está incluída na classe mortal. Trata-se de uma proposição categórica.

Ha quatro destas proposições, conforme segue-se:

a universal afirmativa: que enuncia a inclusão total de uma classe em outra (todo o x é y), designada pela letra A;

a universal negativa: que enuncia a exclusão total de uma classe da outra (nenhum x é y),
designada pela letra E;

a particular afirmativa: que enuncia a inclusão parcial de uma classe em outra (algum x é y),
designada pela letra I;

a particular negativa: que exclui parcialmente uma classe da outra ( algum x não é y),
designada pela letra O;

As proposições se relacionam entre si conforme segue:

A e E são contrárias;

I e O são subcontrárias;

A e I e E e O são subalternas;

A e O e E e I são contraditórias.

O quadro de oposições estabelece a relação entre as proposições categóricas, que revelam as possibilidades de uma delas ser verdadeira ou falsa, a partir da veracidade ou falsidade das demais.

Estas proposições são denominadas de premissas. Quanto a sua veracidade ou não quem cuida são os cientistas e não a disciplina da lógica, a qual não possui qualquer compromisso com a verdade, mas apenas com a estruturação do raciocínio.

Assim, o argumento composto por pelo conjunto de duas premissas e uma conclusão se denomina silogismo. Em sendo as premissas e a conclusão proposições categóricas, então o silogismo será categórico.

ex:

Todo o mamífero é vertebrado;
Todo o primata é mamífero;
Logo, todo o primata é vertebrado.

Primata é o sujeito da conclusão denominado de termo menor. Está incluído na premissa menor.

O predicado da conclusão que é vertebrado, se denomina termo maior. Está incluído na premissa maior.

Estes são os termos extremos.

Mamífero é o termo médio, pois apenas figura nas proposições.

Entretanto, o raciocínio poderá tratar com rigor absoluto dados totalmente falsos. Daí a necessidade de muito cuidado diante de um pensamento lógico. Assim, é importante a atenção aos limites que a lógica oferece a fim de que seja corretamente utilizada, no momento e pelos meios adequados.

exemplo:

Todo o mamífero é invertebrado;
Todo homem é invertebrado;
Logo todo o homem é mamífero.

Neste raciocínio, as premissas são falsas, porém a conclusão é verdadeira. Logo, temos um raciocínio invalido, uma vez que transgride a regra de distribuição do termo médio. Portanto, a veracidade de uma conclusão não pressupõe a veracidade das premissas.

Um outro silogismo interessante, é dado por:

Todo homem é vertebrado;
Todo mamífero é vertebrado;
Logo, todo mamífero é homem.

Neste silogismo as premissas são verdadeiras, porém o raciocínio é inválido, com sua conclusão falsa. Assim, a veracidade das premissas não implica a validade da inferência e nem a veracidade da conclusão. Neste silogismo não houve a distribuição do termo médio.

Outros exemplos:

Todo invertebrado é mamífero;
Todo homem é invertebrado;
Logo, todo homem é mamífero.

Neste silogismo as premissas são falsas e a conclusão é verdadeira e o raciocínio é válido, pois houve a distribuição do termo médio (invertebrado). Mas, a veracidade da conclusão e a validade do raciocínio, não determinam serem as premissas verdadeiras.


Todo mamífero é vertebrado;
Todo homem é vertebrado;
Logo, todo homem é mamífero;

Neste silogismo as premissas são verdadeiras e a conclusão também. Entretanto, se trata da falácia da não distribuição do termo médio. Logo a inferência é inválida. Ou seja, a veracidade das premissas e da conclusão não implicam na validade do raciocínio.

Todo homem é invertebrado;
Todo mamífero é invertebrado;
Logo, todo mamífero é homem.


Neste silogismo as premissas são falsas, a conclusão falsa e a inferência inválida (não há a distribuição do termo médio).

Todo mamífero é homem;
Todo vertebrado é mamífero;
Logo, todo vertebrado é homem.

A inferência deste silogismo é válida mas os enunciados, tanto das premissas ,como da conclusão são falsos. Assim, um raciocínio válido independe da veracidade de seus enunciados, como também, da veracidade destes, não decorre a validade do argumento.

Todo mamífero é vertebrado;
Todo homem é mamífero;
Logo, todo homem é
vertebrado;

Este silogismo apresenta premissas e conclusão verdadeiras e raciocínio válido, pois houve a distribuição do termo médio. Com isso, pode-se perceber que a única garantia dada pela lógica é:

"Se as premissas forem verdadeiras e o raciocínio válido, então a conclusão será verdadeira."

É impossível construir-se um silogismo válido com premissas verdadeiras e conclusão falsa, o que inutilizaria a lógica.

Assim, a única certeza emanada da lógica é a de que sendo verdadeiro o antecedente (as premissas) e válida a inferência (raciocínio), será verdadeiro o consequente (conclusão), nada mais. Ou seja, os argumentos válidos (respeitadores dos princípios lógicos - com a devida inferência) são preservadores da verdade, uma vez que, caso as premissas sejam verdadeiras, se utilizada a inferência correta, a conclusão também será verdadeira, o que nos levará a um argumento sólido.


Caso algo tenha 100% de probabilidade de ser verdadeiro, os argumentos que preservam a verdade também preservarão a certeza (quando a verdade das premissas do argumento se tornou a verdade depois da conclusão ter sido provada). 

Todavia, argumentos válidos cujas premissas são apenas prováveis podem levar a conclusões bem menos prováveis que suas premissas. Portanto, para os argumentos válidos há que se atentar não apenas para a verdade, mas também para a  probabilidade desse algo ser verdadeiro.

Desse modo, a utilização de recursos lógicos deverá ser realizada com permanente atenção aos seus limites.

2 - Lógica dialética:


Esta forma de lógica pressupõe a existência da contradição no âmago do pensamento, pois este possui movimento e historicidade.

O enfoque dinâmico do pensamento se polariza com o mundo da realidade material, conforme seu processo de formação e desenvolvimento. Isso torna a lógica fecunda, pois a matéria do pensamento se expande com o tempo e com a história e contradiz a forma a qual é estática e conservadora.

Ao ser ajustada a forma e o conteúdo, surge a racionalidade real e, caso o conteúdo contradiga a forma e tente ultrapassá-la, haverá uma crise de irracionalidade a ser solucionada por uma nova forma que suplante este conteúdo expandido.

A isto se denomina “salto dialético” da quantidade em qualidade, que leva ao avanço das estruturas de pensamento em seus diferentes momentos na relação dialética racional/irracional, mas que faz com que se alcance uma nova racionalidade.

E.g. a queda das estruturas medievais com o desenvolvimento da produção à época, a qual abriu uma grande contradição com o modus vivendi medieval no que se refere às organizações social e política, as quais não mais davam conta da referida situação produtiva.

Assim, novos patamares de racionalidade organizativa passam a ser impostos de modo que a sociedade não colapse sobre si mesma.


2A - A lógica da argumentação:

Como uma subdivisão da lógica dialética, esta é a forma de lógica onde persiste uma zona de penumbra, onde não existe a certeza referente aos termos empregados. Daí ter esta forma de pensamento sido caracterizada como irracional.

Tal linha de pensamento é a utilizada para defenderem-se pontos de vista filosóficos, sociológicos e antropológicos, bem como é comuníssima na ciência do direito. Mas mesmo assim requer evidências do que estamos falando.

A linguagem aqui utilizada é aquela referente à argumentação, calcada na justificação, ou na legitimação pelo valor e pelo peso das razões postas sob a forma de opiniões verossímeis ou prováveis, o que escapa a certeza do raciocínio formal.

Aqui há espaço para a liberdade em se estabelecerem pontos de vista, a fim de que ocorra o embate dialético de opiniões ou confronto de ideologias e consciências, conforme cada situação ou circunstância histórica.

A argumentação é uma reflexão e uma formulação sistemática sobre a regularidade do discurso concreto que se destina a persuasão por meio do diálogo.

Muitas vezes a fim de que se construam os argumentos, estes partem de proposições dogmáticas, como fizeram os filósofos ao estabelecerem suas escolas (e.g. sofistas e estóicos), bem como ocorre com o direito (e.g. nosso sistema de governo é republicano sob regime democrático).

É por meio desta lógica que se orientam as ações éticas dos homens, o que justifica os valores e atos morais referentes a cada sistema humano.

Logo, para dizer o que é moral temos de entender que a moral possui um sentido de futuro para a preservação do grupo em que vivemos, das inter-relações ocorridas com seus membros e da manutenção do status cuo daquela sociedade.

É dai que surgem os juízos de valor como certo/errado, bom/mau, feio/bonito, sagrado/profano, pois tudo que atenta contra padrões definidos de uma superestrutura social gerada por classes dominantes, passa a ter uma conotação negativa, uma vez que todos somos resistentes a mudanças, principalmente àquelas que atentam contra nossos interesses de classe.

Assim, neste campo a fim de que se estabeleçam “verdades”, há muitos pontos de partida que são meramente postulados para se construírem as teses que desejamos sustentar. Mas estas teses entram em embates dialéticos, onde, não necessariamente, a tese verdadeira vencerá, mas aquela melhor fundamentada.

Ex. matei um sujeito. Parte-se da premissa que matar é crime, pois atento contra um membro do grupo em que vivo e perturbo a paz social (imagine se começam todos a se matarem por vinganças pessoais...). Há toda uma discussão sociológica para tal.

Se provado que fui eu, serei condenado a “x” anos de prisão, a morte ou ao exílio, dependendo de qual seja meu sistema e seus respectivos valores ético-morais.

Mas e se mato na guerra? Serei criminoso? Dependendo do que eu fizer sim. Caso esteja em combate, não sou criminoso; mas se extermino os prisioneiros capturados, sim, serei um criminoso de guerra, uma vez que o sistema ético-moral do mundo em que vivo, o qual segue as Convenções de Guerra Genebra, condena tal atitude.

Entretanto, seria esta convenção valida de forma unânime a todos? Não, pois há membros não signatários e tão pouco há grupamentos humanos que sequer a conhecem, mesmo nos dias de hoje. Assim, em suas sociedades não estariam cometendo crimes de guerra, dentro do sistema em que vivem.

Vejamos:

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